Visitante passa pelo estande da Panasonic na IFA, maior feira de eletrônicos da Europa
ogos, redes sociais e ferramentas como Twitter e Facebook emburrecem ou aguçam a inteligência de seus usuários? A questão foi novamente levantada na semana passada, quando o baixista Bill Wyman, dos Rolling Stones, expressou seu descontentamento com jogos como Guitar Hero, que fariam com que cada vez menos pessoas se dediquem a aprender a tocar um instrumento. Nick Mason, baterista do Pink Floyd, e Jimmy Page, guitarrista do Led Zeppelin, concordam com ele. Mas há quem discorde, alegando que essa revolta é apenas ranzinzice de roqueiro decadente. (
E você, o que acha? A tecnologia nos torna mais inteligentes ou emburrece? )
Será mesmo? Para os especialistas em games musicais, os jovens têm dois motivos para aprender a tocar guitarra. O primeiro é querer se expressar musicalmente; o segundo é o ritual de juntar amigos, criar uma banda, conquistar popularidade, grana e, importante, ter a chance de pegar mulher mais facilmente. É claro que, para essa turma, games de instrumentos não adiantam muita coisa, a não ser em estabelecimentos onde se pode jogar Guitar Hero num palco e fazer a galera delirar.
- É mais ou menos como karaokê. Você se diverte por uma noite, mas isso não vai lhe trazer fortuna, fama nem satisfação criativa - diz Keith Stuart, especialista em games do site do "The Guardian".
Mas se for ouvida a opinião de Alex Rigopulos, CEO da Harmonix Music Systems, empresa que criou Guitar Hero e Rock Band, não nos surpreenderemos quando ele puxa a brasa para sua sardinha:
" Esses games encorajam as pessoas a tocar uma guitarra genuína "
- Esses games encorajam as pessoas a tocar uma guitarra genuína - elucubra Rigopulos, embasado numa pesquisa promovida pela Youth Music ( youthmusic.org.uk), entidade musical filantrópica da Inglaterra, que revelou que 2,5 milhões de jovens daquele país foram inspirados por jogos musicais de console a tocar instrumentos de verdade.
Para reforçar essa teoria, vale considerar que a revista "Total Guitar" ( totalguitar.co.uk), voltada a guitarristas novatos ou medianos, recebeu em 2008 centenas de cartas desde que publicou uma matéria sobre Guitar Hero e o seu maior expoente, o gamer Marcus Henderson. Graças ao jogo, os leitores relataram que foram apresentados a um acervo musical que, de outra forma, não teriam descoberto. E assim passaram a procurar por tablaturas e cifras para aprender a tocar essas músicas na guitarra. (Leia também: Psicóloga diz que Facebook faz as pessoas mais inteligentes e Twitter emburrece )
Saindo do âmbito dos jogos mas ainda no setor da tecnologia musical, vários profissionais das antigas não veem com bons olhos a onda high-tech. Tecladistas de renome notaram que os sintetizadores eletrônicos vêm tornando os músicos preguiçosos e, muitas vezes, incapazes de apresentações impactantes ao vivo.
Keith Emerson, Rick Wakeman e outros virtuoses no teclado - com formação clássica e famosos por suas performances velozes e precisas nos shows - apontam a pobreza e a pouca audácia dos solos dos músicos de hoje, que se tornaram dependentes dos samplers, dos computadores e dos softwares de estúdio.
Mas nem todo avanço tecnológico atrofia as habilidades do músico, conforme exemplifica André Iunes Pinto, responsável pelo blog Overdubbing , aqui no GLOBO:
- Não faltam opções tecnológicas para quem tem em mente se aprimorar na guitarra. Uma delas é o JamVox, software que extrai, em tempo real, o solo de qualquer música, fazendo com que o guitarrista possa treinar junto com sua banda preferida - explica André. - Já a empresa japonesa Boss acaba de lançar o eBand JS-8, pequena caixa de som com efeitos internos de guitarra, que possibilita mudar o andamento de qualquer música e ainda por cima gravar a execução do que foi tocado no instrumento (vide http://jxjw7.tk ).
A discussão "emburrece ou não emburrece" é antiga e extrapola a questão musical, expandindo-se para o próprio uso da tecnologia em geral. Em computação, por exemplo, vários usuários veteranos observam que algumas de suas capacidades mentais nitidamente se atrofiaram ao longo do tempo.
Muitos micreiros que usam o teclado o dia inteiro percebem que, quando escrevem à mão, nem eles mesmos conseguem mais decifrar seus garranchos. Gente que passa anos usando calculadoras e planilhas eletrônicas vem notando franca decadência em sua capacidade de cálculo mental. Motoristas mais jovens já começam a ficar escravos do GPS e prevê-se que taxistas novatos terão dificuldade em montar mapas geográficos mentais das cidades em que atuam por se habituarem a usar o posicionamento eletrônico por satélite.
Com relação aos efeitos da web nos hábitos de consumo de informações por seus usuários, é inegável que a leitura do internauta pulando de site em site diante da tela do monitor é bem mais superficial e impaciente que a do leitor tradicional encarando um livro, ou mesmo uma revista ou um jornal.
A escritora britânica nascida na Pérsia, Doris Lessing, de 89 anos, Nobel de Literatura em 2007, afirmou ao ser premiada que "a estupidez da internet seduziu a geração atual, que vive mergulhada numa cultura fragmentada". Segundo ela, as pessoas pouco leem e pouco sabem a respeito do mundo.
" Nossas certezas de poucas décadas atrás são hoje questionadas por jovens homens e mulheres que pouco sabem do mundo que as cerca "
- Nossas certezas de poucas décadas atrás são hoje questionadas por jovens homens e mulheres que, mesmo após anos de educação, pouco sabem do mundo que as cerca e aprendem apenas uma ou outra especialidade, por exemplo, a usar computadores - escreveu Lessing em seu discurso ( pjr6l.tk ) que, afora essa anacrônica afirmação, é uma peça notável e inspiradora.
Podemos perdoar a velha senhora por suas palavras, mas continuamos vendo pipocar aqui e ali discursos semelhantes ao dela, em geral, saindo da boca de representantes de uma antiga elite cultural que vê seu prestígio sendo lentamente enfraquecido.
Mas nós, que já convivemos bem com avanços científicos, gadgets e novidades high-tech, sabemos muito bem dos inúmeros benefícios que a grande rede nos trouxe, ampliando os horizontes das pessoas e permitindo a elas consultar um volume inédito de conhecimento, um acervo a que, pelas vias convencionais, nunca teriam acesso. Jogos e redes sociais também cumprem essa função.
Ainda estamos engatinhando na democratização da informação. Os tempos atuais, caracterizados pelo caos e pelo ruído gerado por blogueiros, twitteiros e habitantes das várias redes sociais, serão lembrados como a época em que o poder dos poucos começou a ser substituído pelo poder dos muitos.
Mas talvez, num futuro não muito distante, precisemos reviver preceitos básicos que poderão ser esquecidos pelo caminho. Nesse aspecto, vale lembrar o conto de Isaac Asimov, escrito em 1958 e intitulado "The Feeling of Power" (A Sensação de Poder - 5fqfa.tk ). Nele o autor imagina um futuro em que todo humano tem à mão um pequeno computador, que é usado, entre outras coisas, como calculadora. Com isso, as pessoas perdem o interesse em fazer contas. A Humanidade acaba se esquecendo como se lida com números usando as quatro operações.
Até que um dia, Myron Aub, um técnico envelhecido e sem importância, funcionário burocrático, desenvolve um passatempo: copiar num papel os números que vê na calculadora. E começa a brincar com eles, descobrindo acidentalmente como somá-los. Reinventa depois a subtração, a multiplicação e a divisão, tudo isso sem usar calculadoras. É aclamado como celebridade e logo os militares o convocam para encontrar aplicações bélicas para o invento.
Aub pensava que seu invento ajudaria as pessoas e não as destruiria. Desapontado e arrependido, eles se mata com um despolarizador de proteínas.