O escritor Andrew Keen.
“Eu não acho que as pessoas deveriam usar o Twitter como fonte de notícias. Recentemente eu escrevi de brincadeira no Twitter que a Microsoft havia comprado o Twitter, e de repente todo mundo estava falando da suposta venda”. Grande usuário do serviço de microblogging, o jornalista e escritor inglês Andrew Keen não poupa nem a febre mais recente do mundo on-line de suas críticas.
Autor do livro “O culto ao amador”, Keen é um dos críticos mais ferozes da chamada web 2.0 – ou seja, dos sites que se baseiam em conteúdos gerados pelos usuários. Sua tese principal é de que a “democratização” da internet estaria minando a qualidade da informação disponível na rede, substituindo produtos culturais (notícias, filmes, músicas) de alta qualidade por conteúdo “pobre” criado pelos usuários comuns.
“Nunca disse que não deveríamos usar a internet – eu a uso como qualquer um. O Twitter é uma forma pública do e-mail, é uma boa maneira de ‘pensar em voz alta’, mas não publicaria nada com alguma seriedade ali”, explica o escritor em entrevista por telefone ao G1. Keen está no Rio de Janeiro, e participa de um debate às 17h desta sexta-feira (11) na Bienal do Livro.
“Isso (a brincadeira que virou ‘notícia’) reflete o fato de o Twitter não ser ‘mediado’, e é por isso que não se deve acreditar no que se lê ali. Quando acontece algo no mundo, as pessoas procuram fontes confiáveis de notícias, pode ser a CNN, a BBC ou o 'New York Times', ou talvez algum blog. As pessoas sempre pensam em substitutos, o que vai substituir o quê. O Twitter não vai substituir nada. É um site diferente, é bom, é divertido, provavelmente tem um futuro, mas certamente não é o futuro da imprensa”, explica.
O próprio conceito de web 2.0 está caindo em desuso, e muitos especialistas em internet têm deixado de usar a expressão – Keen é um deles. “Existia a ilusão de que sites com conteúdo gerado pelos usuários conseguiriam criar um substituto econômico viável através de anúncios, mas isso não aconteceu. O YouTube agora tenta exibir filmes tradicionais, como o site NetFlix, ao invés de vídeos gerados pelos usuários. A Wikipédia recentemente decidiu usar mais fontes editoriais. A ‘revolução radical’ do conceito de conteúdo gerado pelos usuários acabou, não deu certo”.
Ele diz que o modelo “mais atraente” para a internet nos últimos tempos é o de “web em tempo real” – conteúdo gerado e transmitido ao vivo, como é o caso do Twitter. “É sobre isso que todo mundo está falando, investidores, especialistas. Se você for a um encontro de investidores e falar sobre web 2.0 provavelmente vão te expulsar da sala”.
‘Freemium’
Outro conceito recente que chama a atenção de Keen é a ideia da “internet gratuita”, onde o conteúdo não é cobrado do consumidor final – tese principal do livro “Free” (“De graça”, em inglês), do editor-chefe da revista “Wired” Chris Anderson.
“Concordo com Anderson em alguns pontos. Acredito que a economia do ‘freemium’, quando você dá o conteúdo básico de graça e cobra por serviços adicionais é provavelmente o futuro da mídia”, imagina, mas cita alguns problemas, usando o site de streaming de música Spotify como exemplo.
“O desafio principal de sites como o Spotify não é ser popular. Ele é claramente popular, é um serviço muito atraente – assim como o YouTube. Mas o desafio é: o Spotify vai conseguir transformar sua popularidade em receita? Ninguém quer pagar por conteúdo on-line. O futuro de serviços do tipo ‘freemium’ como o Spotify depende de que 10, 15 ou 20% dos usuários queiram pagar por serviços extra, por exemplo, US$ 9,99 por mês para usar a ferramenta em seu iPhone. Eu não estou convencido de que os usuários querem isso”, afirma. “A diferença entre eu e Anderson é que ele é muito otimista, e eu sou mais pessimista”.
Pirataria
Essa dificuldade para os artistas se sustentarem tem uma raiz – a troca de arquivos (ou pirataria) de músicas e filmes na internet. “Recentemente entrevistei Milos Forman (diretor de ‘Estranho no ninho’ e ‘Amadeus’), e ele acredita fortemente que a única maneira de sustentar a indústria cinematográfica é lutando contra os ‘ladrões’. Eu simpatizo com essa posição, mas acho que temos que pensar em outras questões”.
Keen diz concordar com as medidas duras que alguns governos na Europa e agora nos EUA estão tomando contra os casos de pirataria on-line. “Eu simpatizo com a ideia de que, na Grã-Bretanha, o governo descubra as pessoas que estão roubando e tire os privilégios de rede, diminua a conexão dessas pessoas. Eu acho isso apropriado, porque essas pessoas estão fazendo algo errado”, afirma, chamando a cultura de troca de arquivos de “saque cultural”.
Porém, o escritor morde e assopra, dizendo que as empresas donas do conteúdo partilhado também têm que fazer a sua parte. “Acho que deveria existir uma evolução cultural em termos de propriedade intelectual e na maneira em que as gravadoras, estúdios e editoras apresentam seus conteúdos on-line. Eles devem ceder um pouco”.
Keen dá muita atenção às discussões sobre direitos autorais na era digital. Na sua opinião, é “uma das questões mais significativas do começo do século XXI”, e defende a politização do debate, incluindo a nova onda de Partidos Piratas que começa a se espalhar pela Europa
“O sucesso do Partido Pirata, especialmente na Suécia, reflete essa politização. Creio que eles têm que ser cuidadosos. Precisam deixar claros os limites desse saque cultural que está ocorrendo. Devem dizer: ‘nós não estamos envolvidos com o roubo intelectual, nós acreditamos que isso precisa ser um modelo de negócios. Mas ao mesmo tempo nós queremos uma reforma nos direitos autorais, estamos preocupados com a questão da privacidade na era eletrônica’. Se quiserem participar do debate político ao invés de serem apenas uma piada, precisam afirmar claramente que as pessoas devem respeitar as leis”, aconselha.
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