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quarta-feira, 23 de setembro de 2009

Na Suazilândia, média de vida é de 32 anos e 26% têm Aids

Combate à doença é prejudicado por poligamia e aversão à camisinha.
Parlamentar até sugeriu tatuar soropositivos para tentar conter a doença.

Enquanto a maioria dos países comemora o aumento na expectativa de vida, a Suazilândia, na África, encara uma realidade oposta.

No país, independente do Reino Unido desde 1968, cada cidadão vive, em média, 32 anos, segundo dados da CIA (Agência de Inteligência Americana).

A população, de aproximadamente 1,2 milhão de habitantes tem a maior prevalência de HIV no mundo. No país, são comuns a poligamia e o sexo sem proteção.

Foto: Natalia da Luz/Especial para o G1

Outdoor em Mbabane alerta sobre os riscos do HIV.

“Viemos trabalhar aqui porque é a maior prevalência de HIV do mundo: 26% de toda a população. Em mulheres grávidas, chega a 42%, de acordo com dados de 2008”, diz o francês Aymeric Péguilan, chefe da Missão Médicos Sem Fronteiras-Suiça.

O especialista, que viveu em África do Sul, Moçambique e Lesoto antes de chegar aqui, diz que a população ainda cultiva hábitos condenados pela medicina.

“Um dos maiores problemas é a quantidade de parceiros sexuais e a ausência de proteção. As pessoas não usam preservativos”, diz. Como a população resiste à camisinha e o número de soropositivos é alto, o ministro do Parlamento Timothy Myeni propôs tatuar os soropositivos (as mulheres, na nádega, e os homens, no peito), alternativa que gerou muita polêmica. Desta forma, os prováveis parceiros saberiam o risco de contrair a doença antes da prática.

O projeto de lei ganhou grande repercussão na mídia internacional, mas acabou sendo tratado como piada pelos próprios suázis. “Para nós, é uma alternativa que não respeita os direitos das pessoas com HIV. Quando a população tomou conhecimento, não entendeu, ficou se perguntando o porquê”, diz Thembi Nkambule, diretora nacional da ONG anti-HIV Swanneha. Ela recebeu o G1 em seu escritório, três semanas após a polêmica que logo se dissipou. “O parlamento pediu desculpas e não levou a história adiante”.

Foto: Natalia da Luz/Especial para o G1

Árvore sustenta recipiente que oferece camisinhas gratuitas à população.

No trono desde 1986, está Mswati III, de 41 anos, o rei das 14 rainhas, que costuma escolher as integrantes de seu harém em festas públicas. As interessadas são selecionadas entre grupos de virgens de seios à mostra. Mas Thembi acredita que o rei não tem o poder de influenciar a prática.

“A poligamia é parte de nós, está inserida em nossa cultura. A culpa não é dele”, diz. Segundo ele, há muitos mitos sobre os preservativos. “Há os que acreditam que camisinhas estão infectadas por HIV e que chegam aqui para contaminar as pessoas”, revela a ativista da ONG, que capacita voluntários e atende 180 grupos de 30 pessoas, oferecendo assistência e tratamento.

Falta de camisinhas, definitivamente, não é o problema no país. A nossa equipe caminhou pelas ruas da capital, Mbabane, e viu preservativos à disposição em locais públicos. Próximo a um ponto de van, por exemplo, havia um recipiente com preservativos ainda intactos, o que prova que a solução não está na distribuição. O problema é mudar a mentalidade, lembra Aymeric.

Foto: Arte G1

Mapa localiza a Suazilândia, encravada na África do Sul.

De 1992 para cá, as estatísticas de contaminação com o HIV subiram na Suazilândia, de 3,6% a 26% de soropositivos. “O HIV ainda é um fenômeno novo. A circulação de pessoas cresceu. Elas voltam para rever a família, vão para outros lugares. Essa mobilidade, sem dúvida, ajudou a disseminar a doença”, conta Aymeric. Segundo ele, as estatísticas de tuberculose também se agravaram. “A prevalência dentro do grupo de soropositivos é de 80%”, afirma.

Na área rural, as pessoas ficam isoladas, mas isso não diminui o risco de contrair a doença. Visitamos o vilarejo de Mantabeni, a 30 minutos do centro da capital. A região recebe assistência com ativistas dispostos a orientar desde a prevenção ao tratamento. Faça chuva ou faça sol, eles andam, caminham entre mato e barro dezenas de quilômetros, até chegar ao casebre de encontro. Lá está Petros Malaza, que só fala suázi intermediado por um tradutor.

Foto: Natalia da Luz/Especial para o G1

O suázi Petros Malaza, que descobriu em 2004 que era HIV positivo.

O voluntário descobriu que era HIV positivo no ano de 2004, quando também começou o tratamento. A revelação foi um choque. “A minha vida sofreu uma transformação grande. Fui muito discriminado. Os vizinhos tinham muito preconceito”, diz Petros, que também tem mãe e irmã soropositivas. “Elas descobriram e não queriam se tratar, não tinham esclarecimento”, lembra o suazi. Depois, acabaram convencidas.

Sphiwe Shlongongane teve conhecimento de que era HIV positivo em 2006, quando resolveu testar também se os quatro filhos tinham a doença. Dois tinham e já começaram o tratamento. Por sorte, diz Sphiwe, o menor, que tem pouco mais de um ano de vida, não contraiu a doença. “Comecei a me tratar e depois que ele nasceu fizemos o teste”, fala. A suázi, que também não compreende inglês, sempre viveu na comunidade. Ela cita a discriminação como um desafio que foi superado.

Foto: Natalia da Luz/Especial para o G1

A suázi Sphiwe Shlongongane, contaminada com o HIV.

Aymeric afirma que os soropositivos são discriminados pelo fato de ser uma doença sexual, que envolve muitos tabus. Apesar disso, o soropositivo pode ter uma vida absolutamente normal. “Temos que banalizar isso, não em termos de infecção. É uma doença muito séria, mas em termos sociais. Uma pessoa com HIV pode ter uma vida produtiva, sim!”, diz.

O médico também defendeu a campanha a favor da circuncisão, que reduz em 50% o risco de contrair a doença. “É uma mobilização importante porque muitas culturas tribais não aceitam. Somente os xhosas são circuncisados. Zulus e suázis não circuncisam seus garotos”, conta. O problema é que os circuncisados acham que não precisam se prevenir e usam a justificativa para abolir de vez a camisinha.

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