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quinta-feira, 12 de novembro de 2009

Crescimento desorganizado afeta paraíso de Darwin

Em Galápagos, espécies observadas por cientistas correm perigo.
Introdução de espécies como ratose gado ameaça os animais nativos.

Os montes de lixo malcheirosos na fronteira desse frágil arquipélago, a 965 km da costa Pacífica do Equador, cuja vida selvagem única inspirou a teoria da evolução de Darwin, são uma prova viva de que uma espécie está prosperando: o homem.

Pequenos pintassilgos cinza, descendentes dos pássaros que foram cruciais para a sua teoria, sobrevoam o aterro, que serve a uma cidade em desenvolvimento de equatorianos que se mudaram para a ilha para trabalhar na indústria do turismo local, cada vez maior.

O crescimento da população nas Galápagos, que duplicou para cerca de 30 mil na última década, tem deixado os ambientalistas horrorizados. Eles apontam evidências de que o desenvolvimento já está prejudicando o ecossistema, que fez com que os habitantes mais famosos da ilha – entre eles tartarugas gigantes e atobás de pés coloridos – evoluíssem em isolamento, antes da colonização das ilhas, há mais de um século.

Foto: Ruth Fremson/The New York Times

Em dez anos, população de Galápagos duplicou para cerca de 30 mil pessoas.

O crescimento já está ameaçando tanto o meio ambiente que até mesmo o governo, que ainda estimula o crescimento do turismo, começou a tomar decisões políticas não-populares, como expulsar centenas de equatorianos pobres da província, da qual eles se consideram legalmente proprietários.

Porém, as novas medidas também estão gerando um protesto por parte dos migrantes, que afirmam sentirem-se castigados, enquanto o país continua a desfrutar de dezenas de milhões de dólares trazidos pelos turistas ao Equador, uma das nações mais pobres da América do Sul.

“Estão dizendo que uma tartaruga para um estrangeiro rico fotografar vale mais do que um cidadão equatoriano”, disse Maria Mariana de Reina Bustos, 54 anos, que veio de Ambato no Vale Andino central do Equador. Sua filha, Olga, de 22 anos, foi recentemente detida pela polícia perto da favela de La Cascada, e deportada para o continente.

Colonização

Os primeiros colonos vieram para as ilhas para viver da terra, como pescadores, criadores de gado e fazendeiros. Agora, a maioria das pessoas, que fazem um vôo breve de Quito, a capital do Equador, ou que chegam sorrateiramente à ilha de barco, é atraída por diferentes tipos de riqueza: um salário relativamente alto que podem ganhar como motoristas de taxi, empregadas domésticas ou trabalhadores da burocracia crescente do local.

Durante décadas, os líderes do país fizeram muito pouco para prevenir que as pessoas viessem para cá, de certa forma para construir a indústria de turismo e, em seguida, para garantir que o governo tivesse uma presença entre os pioneiros. Parecia haver algum limite natural em andamento: o país reservou 97% do arquipélago como área natural.

Contudo, como o turismo e a migração cresceram na última década, a pressão começou a aumentar dentro da comunidade ambiental e científica e no exterior para o Equador restringir a população da ilha. Em 2007, a ONU incluiu Galápagos em sua lista de patrimônio natural ameaçado.

Os cientistas alegam que as pessoas já causaram danos significativos e apontam derramamento de combustível, caça de tartarugas gigantes e tubarões, e a introdução de espécies invasivas - ratos, gado e formigas-de-fogo – que ameaçam os animais nativos.

Até mesmo atividades humanas aparentemente inofensivas – como possuir um animal de estimação- podem trazer grandes consequências.

“Com as pessoas vêm os gatos, e os gatos ameaçam certos animais que não existem em nenhum outro lugar do mundo”, disse Fernando Ortiz, coordenador do Programa de Galápagos para a Conservação Internacional.

'Migra'

O conflito é proveniente das próprias regras que fizeram com que Galápagos fosse colonizada, apesar da falta de água doce no arquipélago. Tecnicamente, a moradia é concedida para um número limitado de habitantes, incluindo os nativos e seus cônjuges, pessoas que chegaram antes de 1998, e aquelas com visto de trabalho temporário.

A polícia, conhecida como “migra” – por deterem os imigrantes ilegais - estabeleceu pontos de controle improvisados por toda a ilha. No entanto, o mesmo governo que paga o salário dos policiais também oferece subsídios que iniciaram quando o Equador estava interessado em aumentar a população. Um desses auxílios faz com que a gasolina tenha o mesmo custo do continente.

Outro permite que os moradores viagem de uma ilha para outra, ou para Quito, pagando o mesmo valor dos estrangeiros. As falhas do governo também aumentaram, como por exemplo, o mercado negro de moradia, que está cada vez maior: imigrantes se casam com residentes estabelecidos para obter o tão desejado documento de identidade.

Resultado: as ruas de Puerto Ayora atraem as pessoas com discotecas, bancas de comida e lojas de suvenires. Na periferia, um outdoor com a imagem de Leopoldo Bucheli, prefeito em prol do desenvolvimento, celebra um projeto chamado “El Mirador”, que está limpando uma área nos arredores da cidade para que mil novos lares sejam construídos.

“Tudo o que queremos, assim como todas as pessoas desse planeta, é uma existência digna”, disse Yonny Mantuano, 36 anos, que comprou um terreno para construir uma casa em El Mirador.

Foto: Ruth Fremson/The New York Times

Crescimento desorganizado marca a história do arquipélogo

A noção de vida um tanto esquisita do governo de Galápagos é ecoada pelo sentimento das pessoas. Margarita Masaquiza, uma índia de 45 anos, que chegou aqui aos 14 anos, abomina as expulsões do governo.

“Construímos esta província com nossas próprias mãos. Dói ver o nosso povo deportado como animais”, disse ela. “Afinal das contas, somos equatorianos indígenas. Como podemos ser ilegais em nosso próprio país?”

Todavia, quando questionada sobre o impacto de novos migrantes para seus 4 filhos e 4 netos, Masaquiza respondeu com outro tom. “Devemos preservar as oportunidades para as nossas famílias”, disse ela.

Crescimento

A maioria das pessoas em Galápagos mora em San Cristobal, uma ilha que, há décadas, foi uma colônia penal, e em Santa Cruz, onde fica Puerto Ayora. O desenvolvimento também está se espalhando para outras partes do arquipélago.

De Isabela, a maior das ilhas, é possível ver a fronteira de Galápagos.
Apesar das ruas de areia, Puerto Villamil, a principal cidade de Isabela, se parece com uma cidade em desenvolvimento.

Operários trabalham fervorosamente em 200 novas casas de blocos de cimento na fronteira da cidade. Apenas cerca de 2 mil pessoas vivem na cidade, apesar de o lugar ostentar uma das maiores taxas de crescimento populacional de Galápagos, aproximadamente 9% ao ano.

“Eu ganho 1.200 dólares por mês aqui, enquanto no continente, eu ganharia apenas 500 dólares”, revela Bolivar Buri, de 26 anos, operário da construção civil nascido em Puerto Villamil, que fez uma pequena fortuna este ano ao vender um terreno por 8 mil dólares que comprou há seis anos por apenas 600.

Entretanto, até mesmo nas áreas menos deterioradas da ilha, não restam mais dúvidas de que esta já não é mais a terra que Darwin deixou.

Na estrada que vai de Puerto Villamil para a cratera do vulcão da Sierra Negra, caçadores vão a cavalo em busca de porcos selvagens, uma espécie trazida por marinheiros há mais de um século. Garças-brancas, outra espécie trazida para a ilha, voam sobre eles.

Há poucos dias, Manuel Lopez, um imigrante fazendeiro de 36 anos que cuida do rebanho no nevoeiro do vulcão, saiu do interior da floresta repleta de goiabeiras, parou debaixo do sol equatorial, encolheu seus olhos e disse: “Se for o desejo de Deus, eu permanecerei nesta ilha”.

“Estamos em Galápagos por um motivo”. E continuou, questionando um visitante: “É ou não é?”

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